domingo, 8 de março de 2009

Tchon di Kauberdi

Do conteúdo de Verdade, enformando o Magistério
E a Prática teatral respectiva do Grupo Cénico
TCHON DI KAUBERDI:

Para BRECHT, toda a dramaturgia não aristotélica é experimental.
"En effet, sans aller jusqu’à ce degré de dilution de la Notion, on peut dire que l’expérimentation, au théâtre, concerne tout ou partie de l’activité dramatique, du Texte en passant par l’Architecture et la Scénographie, les Sons et les Rythmes, le Costume et la Gestuelle, ou encore l’Électronique.
D’autre part, si l’expérimentation s’intéresse au tout de l’activité dramatique, elle tend naturellement à réaliser, non des produits cohérents et finis, mais des propositions suffisamment élaborées pour être présentées à un public de juges et de connaisseurs, suffisamment renouvelées et remise en question aussi pour que les expériences s’enchaînent dans une sorte de développement dialectique. (…).
Enfin, mais quelles qu’elles soient toutes les tentatives de théâtre expérimental travaillent sur une exploration et un renouvellement des pouvoirs de l’espace et du temps, sur la fascination de l’image et l’exaltation du corps, en conjuguant ou non ces trois tendances
."

(1) O termo, Teatro experimental, designa, antes uma atitude de crítica e ruptura, não só, ante à ordem teatral pré-estabelecida, normalmente centrada numa lógica burguesa (comercial e mercantil, ipso facto), de um teatro com repertório fixo, clássico e de fácil “compreensão” para as massas, outrossim, demais designadamente à ordem social e ideológica que servia de base e esteio a tal teatro. Deste modo et pour cause, Teatro Experimental pode ser outrossim e, ainda, definido como Teatro de vanguarda, Teatro laboratório, Teatro de pesquisa e de Investigação ou Teatro moderno, na genuína acepção da expressão, obviamente.
(2) Com efeito, de consignar avisadamente, que a partir do século XIX, passando pelos movimentos de vanguarda dos anos vinte do século XX pretérito, pelos inovadores franceses, designadamente, o actor, escritor e encenador Antonin ARTAUT (1896-1948) e o actor/encenador Jacques COPEAU (1879-1949) e, sem olvidar, obviamente os realistas críticos como, nomeadamente os dramaturgos/encenadores alemães, Erwin PISCATOR (1893-1966) e Bertolt BRECHT (1898-1956) e, outrossim e, ainda, por uma constelação, quase interminável, de grupos experimentais que surgem no contexto do pós-guerra (sobretudo à partir dos anos 60 e 70 do mesmo século XX passado), o Teatro Experimental instalou-se no panorama teatral mundial, outorgando voz a uma necessidade que serve uma realidade contemporânea pós-moderna, como tal auto-reflexiva, crítica, eclética e alternativa.
(3) Envidando, pedagogicamente encontrar alguns pontos de contacto e conexão respectiva, entre todos os movimentos, ora enunciados, três grandes atitudes distintas (muitas vezes interligadas), atitudes que ajudam, aliás, a explicar a origem do Teatro Experimental merecem, ipso facto, não só, ser conhecidas, como sobretudo estudadas apropriadamente. Ou seja:
a. Uma atitude técnica e estética inovadoras;
b. Uma atitude ideológica, social e ética;
c. E, enfim, uma atitude auto-reflexiva.
Explicitando, apropriadamente, de feito, tendo presentes as inovações (na iluminação, nos espaços arquitectónicos e nos diversos materiais a utilizar) que constituem uma constante ao longo de todo o século XX e agora, já em pleno século XXI, o teatro principia a experimentar, com toda a eficácia possível, as potencialidades que estas inovações oferecem, em substância.
Por outro, para além do trabalho do texto, emerge a figura do encenador, do director de actores, dos técnicos, passando, deste modo, o espaço teatral a explorar novas linguagens e a constituir, outrossim um espaço inovado, já que tenta voltar a impressionar os sentidos através do artifício.
Palcos móveis, cadeiras que se podem remover, número infinito de luzes e som muitas vezes ofuscam, outrossim a autêntica essência do texto, já que, se estas inovações não tiverem um propósito consentâneo, não passam de artifícios vazios e infecundos, obviamente. Eis porque, COPEAU lucidamente critica todos aqueles “inovadores”, que apenas experimentaram, uma perspectiva técnica, perspectiva essa desprovida, porém de sentido dramático e, evidentemente sem objectivos concretos para além da impressão imediata. E segundo o próprio COPEAU, estes autores ficaram a meio do que devia ter sido o seu percurso teatral.
(4) Outras das facetas relevantes do Teatro Experimental diz respeito a sua função eminentemente pedagógica, social, moral e ética. De feito, enquanto assunção cultural e artística de rechaço à ordem estabelecida (assaz vetusta e decadente), o Teatro Experimental ganha, muitas vezes, contornos de teatro de repto, modificando, não só, as temáticas a apresentar, numa atitude de crítica social (positiva), bem como as estratégias dramáticas a utilizar, pois as prístinas serviam outrossim a sociedade, onde vinham exercendo o seu magistério crítico, com elevado sentido de responsabilidade. Deste modo e, nesta dinâmica, se diligencia assertiva e assumidamente, que o Teatro (vida feita Arte), não só, desperte para novas temáticas, como outrossim, que as suas linguagens mudem, para melhor reflectirem as suas mensagens, muitas vezes de ruptura (na acepção pertinentemente didáctica), face ao poder em vigor.
(5) Estamos, neste particular a pensar, concretamente, nas históricas propostas teatrais oriundas do fecundo magistério de PISCATOR (Teatro proletário), bem como as de BRECHT (Teatro épico). Ambas tentam chamar à atenção do Público para uma classe humilhada, marginalizada política e socialmente e, para a necessidade imperiosa de uma démarche conducente à uma radical mudança no status quo. Nesta dinâmica, as técnicas teatrais rompem outrossim com as convenções estabelecidas. Os heróis trágicos clássicos, de estatuto social elevado, são substituídos por heróis que representam grupos sociais humilhados, muitas vezes, sem nome, pois o indivíduo dava lugar a um esforço colectivo. De feito, este teatro denominado de “engagement” e, que visava a edificação de uma nova ordem mundial conducente, ipso facto, ao modelo de sociedade, privilegiando o Ser em detrimento do ter, dispunha de novas técnicas e uso de materiais, que servissem adequadamente para o efeito almejado e, outrossim melhor espelhassem a Mensagem a transmitir, sob o signo e imperativo, eminentemente didáctico-pedagógico, designadamente a utilização de áudio visuais e linguagens por vezes, um tanto ou quanto, jornalísticas.
(6) Finalmente, de consignar, com ênfase, o caris auto-reflexivo, outrossim presente no Magistério de actuação do Teatro Experimental. De feito, aliás, como a própria designação indica, experimental remete-nos para a experiência e tentativa. Deste modo, este tipo de teatro outorga grande importância ao próprio processo teatral, em si, obviamente. Eis porque, no âmbito desta dinâmica, uma peça é escrita, re-escrita, re-interpretada, discutida, modificada, trabalhada dialecticamente entre encenador, actores e público. Na verdade, uma peça, para muitos grupos teatrais jamais está terminada, chegando, por vezes, ao ponto de constituir apenas um exercício de especulação pluri significativa (aparentemente). Por outro lado, os próprios textos, muitas vezes, abordam problemáticas teatrais, procurando o lugar e essência do teatro na realidade e da realidade no teatro. Entramos, assim, já no domínio do metateatro, ou seja do teatro que tem como objecto de criação, o próprio processo teatral, desconstruindo e desmascarando o seu universo fictício e artificial. Donde e daí, evidentemente, Teatro se mistura, desta forma, com a realidade, desafiando, em última análise, a própria definição e conceito de Teatro.
(7) Enfim e, em suma, como remate consentâneo, podemos e devemos asseverar que o Teatro Experimental assumirá sempre, no âmbito da sua pragmática existencial efectiva, como uma autêntica e verdadeira voz de Liberdade plena contra qualquer ordem nefanda estabelecida, ou um qualquer preconceito. Sim, efectivamente estamos ante um Teatro que dá voz ao outro, que explora os domínios inter- e multi-culturais, que baseia a sua prática na inovação e reciclagem constantes, que abarca e recria técnicas vetustas e modernas, como sendo o filme, a televisão, a dança, a pintura, o circo, a literatura, a música, a informática, a expressão corporal. Eis porque, efectiva e evidentemente, nasce e renasce, com potencialidades, cada vez mais ilimitadas, num elevado e verídico crescendo artístico e estético, culminando, destarte, numa assunção dialecticamente consequente.

Lisboa, 07 Março 2009
KWAME KONDÉ

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